Klabin na mídia
08/10/2022
Sustentabilidade
Fatos falam mais que o engajamento na crise climática
As emissões de gases de efeito estufa continuaram intensas no mundo mesmo com o crescimento do discurso ESG
Vamos aos fatos: nos últimos três anos — para pegar dados recentes e coincidentes com o crescimento do discurso ESG, em especial voltado para o meio ambiente—, as emissões de gases de efeito estufa continuaram intensas no mundo. No Brasil, a situação não é melhor, com taxas anuais recordes de desmatamento, só na Amazônia, acima de 13 mil quilômetros quadrados, contribuindo ainda mais para essas emissões.
As consequências? Continuamos na rota ainda acelerada para não cumprir o Acordo de Paris, firmado no final de 2015 e que prevê limitar o aquecimento global entre 1,5 oC e 2 oC na comparação com o período pré-industrial.
Mais fatos: há dois eventos importantíssimos agendados para acontecer até o fim do ano, que teriam de servir para tirar do papel esses discursos, planos e engajamentos em sustentabilidade de governos e iniciativa privada. Falo da COP27, que acontece em novembro no Egito e do segundo turno das eleições presidenciais aqui no Brasil.
Somente na Amazônia brasileira, entre os dias 1º e 25 de setembro passados, já havia sido quebrado o recorde mensal de número de queimadas que ocorrem por ação humana, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Ampliando um pouco o período, ainda segundo o Inpe, a emissão de CO2 na região mais que dobrou em relação aos oito anos anteriores, chegando a 520 milhões de toneladas.
A consequência — segundo o cientista brasileiro e autor líder do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC, na sigla em inglês) da Organização das Nações Unidas (ONU) Paulo Artaxo — é que a proporção de emissões de CO2 absorvida pelos oceanos e ecossistemas terrestres, hoje em 70%, está diminuindo, indicando saturação na capacidade da natureza nessa tarefa. No futuro, pode cair a menos da metade.
Como é claro, comprovado pelos números e pela ciência, o cuidado com o meio ambiente continua basicamente no discurso, no engajamento — ferramentas importantes, mas obviamente insuficientes. É preciso tirar do papel as ações e compromissos anunciados, colocar a mão na massa e tomar ações concretas que detenham o aquecimento global.
As Conferências da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP) ganharam mais relevância nos últimos anos, com a presença maior de representantes do setor privado e de empresas globais. Teremos outra COP no mês que vem. Mais do que discutir os problemas já conhecidos, será preciso buscar e cobrar ações efetivas. Há muito o que fazer.
No Brasil, para ficar na minha seara, entre as mais de 400 empresas listadas na B3 atualmente, para apenas 13 suas metas foram aprovadas pela iniciativa Science Based Targets (SBTi). É evidente que, para investir em projetos sustentáveis, é preciso financiamento. Por isso o setor financeiro também deve ampliar seu foco nesta tarefa global. Já está mais do que claro que conter o aquecimento global é imprescindível para sustentar a atividade econômica.
O governo brasileiro também tem a obrigação de melhorar, e muito, a política ambiental, estimulando financiamentos, fortalecendo órgãos fiscalizadores e ajudando a criar, em parceria com o Poder Legislativo, projetos que estimulem as ações positivas e punam as negativas.
A humanidade terá de conviver com as consequências irreversíveis das mudanças climáticas, como aumento no nível dos oceanos devido ao derretimento de geleiras pela temperatura mais elevada e, no campo social, êxodo de regiões menos favorecidas, impactando a produtividade e a atividade econômica global.
Como já afirmei algumas vezes e volto a reforçar com perseverança, é preciso vontade política dos setores público e privado. O mundo não vai acabar. Mas teremos de nos reinventar como nunca para lidar com a realidade que deverá se constituir até 2050. Talvez as consequências sejam muito piores do que o esforço para agir agora.
*Cristiano Teixeira, embaixador pelo clima da Rede Brasil do Pacto Global da Organização das Nações Unidas, é membro do Business Leaders da COP26 e CEO da Klabin